Financiamento dos residenciais de alto padrão deve continuar como opção preferencial em oposição ao pagamento à vista
A despeito da projeção da taxa básica de juros (Selic) na casa dos dois dígitos e de uma expectativa de desaceleração da economia, com crescimento do PIB inferior a 5% em 2021, a demanda pelo crédito imobiliário no segmento de alta renda neste ano que se inicia não deverá sofrer um grande impacto. O financiamento dos imóveis de luxo tem tudo para continuar sendo a primeira opção dos compradores em oposição ao pagamento à vista.
De acordo com a pesquisa Focus do Banco Central — levantamento semanal de expectativas dos agentes de mercado do Bacen —, o prognóstico para o juro básico da economia em 2022 é 11,5%. Na última vez que os juros de curto prazo atingiram esse patamar, em abril de 2017, a taxa média do crédito imobiliário chegou a 10,63%.
A presidente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), Cristiane Portella, aposta na manutenção das taxas do crédito imobiliário praticadas no sistema bancário em patamares bem abaixo da Selic. Na sua avaliação, em um cenário de juros altos e crédito imobiliário com taxas inferiores à da Selic, não há por que o investidor mobilizar capital para adquirir um empreendimento de alto padrão.
“O financiamento imobiliário sempre ofereceu as melhores taxas em relação aos demais instrumentos de reserva de valor, e os compradores de alto padrão vão continuar optando pelo crédito imobiliário até como forma de manter a liquidez”, afirma, argumentando ainda que, para os investidores com recursos em caixa, o financiamento da compra de imóveis de luxo representa um ótimo negócio, na medida em que o dinheiro pode ser direcionado a aplicações com maior grau de risco, mas que ofereçam melhor rentabilidade.
Esse movimento parece explicar em parte o crescimento histórico de 95%, no acumulado até outubro de 2021, das liberações de crédito pelas instituições afiliadas à Abecip para a aquisição de imóveis: R$ 139,3 bilhões contra R$ 71,5 bilhões registrados em igual período de 2020. Cristiane lembra que, ao longo de 2021, diversos bancos flexibilizaram as taxas de juros, aumentando a oferta de crédito imobiliário para a aquisição de imóveis de alto padrão.
“Para os clientes desse segmento, as condições de financiamento foram ainda mais vantajosas. Não creio que os bancos estejam dispostos a perder esse cliente e frear o crescimento do mercado de incorporação de alto padrão. Até porque os preços os imóveis continuam atrativos.”
RESILIÊNCIA
Roberto Sampaio, sócio e conselheiro da Empírica, empresa gestora de crédito estruturado, também defende a tese de que o cenário da alta dos juros não impactará de forma significativa a demanda pelo crédito no segmento de incorporação de luxo. Apesar de admitir que a taxa Selic acima dos dois dígitos pode comprometer fortemente atividades ligadas ao ciclo da economia, como o setor imobiliário, ele ressalta que o nicho da construção civil voltado para a alta renda deverá se manter aquecido ao longo de 2022.
“Esse segmento é muito resiliente e de total interesse das incorporadoras”, diz Sampaio, completando que, para o comprador com renda elevada, a oferta de financiamento imobiliário se manterá no nível de 2021.
Claudio Yaginuma, diretor de Crédito Imobiliário da MPD Engenharia, concorda que até o momento não houve variações expressivas nas taxas de juros ofertadas pelos bancos. Segundo ele, a perspectiva é de estabilização, mas em decorrência da insegurança econômica, agravada pelas incertezas no plano político em razão de ser um ano eleitoral.
“No geral, estamos otimistas. A adoção de taxas menores que a Selic no crédito imobiliário deve-se à garantia desse tipo de empréstimo, que mantém boa liquidez, uma vez que a procura por imóveis permanece em alta”, avalia, acrescentando que, em 2022, o setor da construção civil deverá continuar ajudando na recuperação da economia nacional, porém, com uma projeção bem mais lenta, tendo em vista a grande elevação dos custos básicos do setor.
“O mercado ainda está bem aquecido, o estoque foi bem vendido durante esse período de taxas baixas, então, devemos passar mais um ano sem crise. Porém, sabemos que tudo depende de fatores externos e estamos atentos ao poder de aquisição dos clientes finais”, garante.
Mercado espera por novos meios de captação de recursos
Fluxo de concessões de crédito imobiliário para alta renda continua no foco de interesse das instituições financeiras
O ritmo do financiamento de imóveis de luxo ao longo deste ano deverá ser mantido, embora com menos velocidade do que a expansão recorde de 32% do ano passado. E, de acordo com especialistas do mercado, a maior contribuição não virá a oferta do crédito tradicional pelo sistema bancário, mas por meio de outros instrumentos de captação de recursos no mercado financeiro, como os Fundo de Investimentos Imobiliários, os certificados de recebíveis imobiliários (CRI) e o crédito verde.
O conselheiro da Empírica avalia que boa parte do financiamento imobiliário no segmento de alto padrão poderá ocorrer por meio da securitização via certificados de recebíveis. “Essa indústria vem crescendo e deverá se expandir ainda mais a partir deste ano”, garante Sampaio. De fato, o fluxo de concessões de crédito imobiliário para o mercado de alta renda continua no foco de interesse das instituições financeiras.
Segundo analistas, um dos exemplos nesse sentido foi o anúncio em dezembro da parceria do Grupo XP com a Direcional Engenharia para a criação da Direto, startup de crédito imobiliário, que tem o objetivo de ofertar produtos financeiros inovadores para o setor. Entre eles, a concessão de empréstimos, inclusive em parceria com outras instituições financeiras, para aquisição de imóveis novos e usados por pessoas físicas.
Na outra ponta, Claudio Yaginuma, da MPD Engenharia, defende a ampliação das linhas de crédito verde para imóveis de alto padrão. “Ter uma linha de crédito com algum diferencial seria bem interessante para os compradores de residenciais de luxo, como, por exemplo, uma linha específica para os ‘empreendimentos verdes’ com juros mais baixos”, diz ele.